romina Conti

 

parte 1

 

os três azuis franceses

 

 

azul-marinho

 

Quase Negro noite além

Perto escaras maresias

Cais, caos, faraós e faróis

 

No Egito um homem

Veste azul-marinho

E enfrenta as estrelas

 

Vasculha o céu deserto

De algum puçá

Que o Escorpião que sou

 

Galáxia impura

Inocula o veneno próprio

Do amor impróprio

 

Pela tempestade

Nas pernas do Oásis

Chovem suicidas

 

"Liberdade, Liberdade

Abre as Asas sobre Nós"

 

 

 

azul-turqueza

 

Todos são iguais perante a lei

Mas há os mais iguais

 

Há os mais iguais perante deus

Há os mais iguais perante a lei

 

Pior, os mais iguais perante a lei

São tão iguais quanto os iguais perante deus

 

Pelo menos no céu occipital do Ocidente

Onde se arrependendo no fim de Hordelin

 

Rimbaud cuspiu a hóstia sagrada

 

 

 

azul-final

 

No final todos

Os amigos e os inimigos

Se reúnem num churrasco

 

Comem a carne do Bispo

E as sardinhas

 

No céu os fogos de artifício

Entram pelos orifícios negros

 

E um dia voltam

Caindo na noite de natal

Feito um colírio no plenilúnio

 

Laranja do Pequeno John

 

 

 

 

*

 

à toa estão as ondas

e o seu  perfume de falésias

 

explodindo

imprimindo no verde

espumas brancas

 

brumas em que me perco

teu ventre sempre sente quando estou por perto

 

aperto

as tuas  pernas no deserto

 

no sal do sol da praia

marasmo maresia mar de dia

 

à noite saltos ornamentais

na cama d'água

 

me visto de ressaca ao fim do azul

do céu

 

seus lábios roxos de escorrega

seu principal desejo

 

sentir meu colo no teu colo e colados

feridas

 

serem sérias entidades do mar

calmaria agora que em teu rosto sardas há

 

ah yemanjá

 

 

 

 

camboja

 

o copo a noite a morte

enfim o grito de socorro

 

a britadeira ou o som

do motor no dentista

 

faz desaguar o mar que há

numa criança

 

mija

 

 

 

 

alvo de palavra

 

a boca  do corpo

a borda  do copo

a borda da mata

borda no céu do

brasil  seu modo

de  vista,  razão

ou duodenite no

portador de mim

 

ocaso concluo q

sai  muito   arfei

 

afim  do  ciclone

clonado em você

 

 

 

 

dentadura

 

só quero seu corpo

no copo

 

 

 

 

sem aviso

 

tatuagem

no ventre

vale

 

balança

a bandeira

na mão

 

bolina

o mastro

do espasmo

 

todo o corpo

é seu tremor

tsunami

 

terremoto

 

 

 

composição sobre o corpo

                           tudo e nada

 

como

se

não

fosse

fóssil

o corpo

físsil

explode

 

como

se

não

fosse

fácil

ofício

de corpo

oco

implode

 

como

se

não

for

flor

corpo

tudo

pode

 

 

 

 

*

 

A morte é um e-mail anexado

Com um vírus incurável

E silencioso

 

A morte é um anexo

Uma dor que vem do plexo

O início do nexo

 

Na mensagem vem escrito

Não tenha cuidado

E leia com atenção

 

Pode abrir

Que não tem vírus não

E você se abre tanto

Que dá um tiro em si mesmo

 

 

 

 

peripatético (as velinhas apagadas em mais um aniversário)

ou ainda na calmaria do mar

 

Não ando

Escrevendo nada

Apenas ando

 

Pulando

Ganguru

Sapo

 

Pulsando

Coração

Quasar

 

Paro

Para não pensar

Em nada

 

Estático

Feito o puma

Sem vento

Na pluma

Nas velas

O sopro

Da morte

 

 

 

 

ambiguidades nada mais

 

A palavra exata para dizer guerra é guerra.

Também bomba, dinamite, pólvora.

Por que então um subterfúgio agora,

que me leve a arranhar a dúvida

de que vivemos dias de guerra.

Por mais que queira falar daquela baleia

dentro de uma lata de coca-cola,

arrotando ondas pelo seu chafariz natural.

 

Por mais que sonhe com os contornos

de todo o meu esforço no quadro negro

e suas molduras que se fazem de fórmulas

e esquemas literários de rimas e escolhas

dicionaristicamente narcísicas, que nada

tem haver com os falos que derrubaram

a virilidade americana e a sua impotência.

 

E a poesia é mais do que quem geometriza

o melhor sentimento. Ou quem carboniza

com bisturis elétricos e pinças as sobrancelhas

e os retoques de um artigo definido que está

num lugar onde não deveria estar.

 

Poema é star. Poesia é estar.

Ë também a iguana e o camaleão

que são uma puta prova de que o Sol

é a Lua de noite quando tudo apaga o vento

e de manhã só podemos

ouvir as sombras das sobras do lixo

indo para uns lugares onde catadores

de esperança caminharão sobre cacos

e exibirão o sorriso quando encontrarem

o resto do resto do existir que são.

 

Poderia aqui camuflar com algum ósculo

bem bonito: como o beijo que James Dean

nunca deu em Marilyn Monroe. Como

quando São Marcelo diz que escolheu Cristo

e a sua mulher o acompanhou. Beleza humana!

 

Poderia camuflar de sentimento o meu aparato

pulmonar. Poderia deixar de sonhar.

Poderia poder o que me colocaria em xeque?

Mas cada nova rosa que nascerá neste poema

virá de uma lágrima de alguém que quer contar

um segredo tão sincero que pode resolver

o problema do tanque austero que penetra

nos olhos do cemitério ressuscitando deuses.

Por quem a humanidade briga.

 

E dizem que eu reclamo. Como não reclamar?

Por que cada poeta se acha o melhor que há?

Por que o que é mais parecido com você

é quem irá lhe detonar? Às vezes ou sempre

prefiro me calar um pouco para ouvir

a desconfiança dos galhos verdes

que quando balançam vão juntando papagaios.

Não balançam com a brisa e sim com a briga.

Que tristeza para as crianças lá embaixo!

Puxando a linha que deram a existência.

 

Quanta exuberância perdida

dentro de uma flor que viverá numa redoma.

E de que importa o idioma?

Quem se esconde por detrás de um diploma?

Quem pode me ensinar o que já sei?

 

Mas tudo isto não é poema

Eu não posso falar de mim sob pena

de estar sendo auto-referente.

Falar de meu tempo é abominar a metáfora.

Escrever poemas concretos com amor

é cuspir no vento.

Então o que querem que eu quero?

Ser sincero? Ser o oposto de tudo

Que venero?

 

A poesia é um verão com muitas chuvas

E cada chuva tem uma cor.

E cada cor tem um equilíbrio que desequilibra

quem eu sou neste instante.

 

É um mar arfante que poderia se chamar de imã

e que suga para dentro tudo que não pode ser

mas tem vontade e força de se suicidar

depois de ter entendido que nunca

acharemos um outro lugar melhor do que o poema

para dizer o que o verso deve constatar.

 

Como agradar ao Bruno Tolentino e ao Régis Bonviccino?

Se não é normal querer agradar que me digam.

Ou beijem as duas faces que estão ocultas atrás

da minha grande barba florestalmente

arborizada para sentir as carícias

dos dedos mais cautelosos em cardá-las

que são os meus.

 

Como agradar?

Eu fumo cigarros fedorentos e baratos.

Não me dão uma onda em que eu possa criar

uma metáfora nova para o Antônio Carlos?

 

Onde moro? Onde mora quem me mora.

Como desagradar a todos?

Como ser o centro do fogo?

Como estar nos vinte mais e não estar nos cem mais?

 

Acho que devo calar e ser o que aquilo mesmo é.

Sempre dizem. Deve lapidar. Deve escolher

a palavra exata para dizer o que quer dizer.

 

Então tudo que me dizem faz parte da grande

estranheza que provoco nos que nada têm a dizer.

Por que quem mais que eu pode saber o que e como quero dizer?

Vá para um lugar bem jovem e bacana.

Se libere num fim de semana e pare de futucar

amplificadores com baionetas.

Pare de me aconselhar pois não quero levar-lhe

a nenhum lugar que não queira ir.

Vamos dar um passeio pelo outro lado.

E se nossas mãos estiverem enlaçadas por um novo sonho,

de que importa?

Por que me impedem que sonhem com labaredas

surgindo da boca da estátua da liberdade?

Ou me ver num microscópio.

Ou num astrolábio. Ou num aerograma pedindo paz.

Vamos viajar num aeroplano.

Que não haja nenhum plano para o voo.

E que durante o voo fiquemos cegos e inebriados

com tudo o que não podemos ver e vimos.

As palavras falarão por si.

Os elefantes não perderão tão fácil seu marfim.

E cada concha que escutarmos desvendará outros oceanos.

 

Outros planos. Outros enganos.

 

Quero me enganar no delírio que me dopa.

No plágio que me escapa.

Na mente que me decapta.

Eu quero parar de falar de mim e de você e de tudo que me importa

mas não consigo.

 

Poesia não é confissão.

Poesia não é contramão.

Poesia não é poema.

O que é poema e o que é poesia então?

 

Poema é uma algema que a poesia coloca na mão?

 

Enquanto escrevo o que me deforma e o que será motivo de galhofa

e o que mais tarde virará farofa.

 

Poesia é farofa.

Nesta minha farofa

tanques estão voando com asas de pterodátilo

mergulhando feito pelicanos à procura da caça

e voando sobre o desequilíbrio químico

de alguma dopamina que me faltou neste momento

onde desato o nó górdio do futuro

e aponto minhas pistolas de sexo

para um paradigma que não seja sintagma também

e para uma sintaxe que exclua

o anjo sonolento que caminha no parapeito da discórdia

provocando um caos que não mais choca

nuvens de pororoca

e tudo mais que agora me faz lembrar todos aqueles

que deram o sangue azul de suas vidas pela poesia

e não pensaram em agradar tanto aos outros quanto a si próprios.

 

Dê-me uma razão para amar.

Para aprender a dizer tudo como você quer.

Dê-me uma ambiguidade para sonhar!

 

Todas as poltronas estão vazias.

O filme da minha vida vai passar.

E só eu vi tudo que você nunca verá.

Só o poema deixou-me lúcido para não me misturar

na paçoca desta guerra boba.

 

Poeta é quem quer ser poeta. Poesia é quem quer

guerrear com plumas

abanar as manhãs e tardes noturnas e as noites diurnas

 

e eleger pelas urnas

e não por si quem é poeta e quem não é.

Poeta é nome de praça.

Não deve ser nome de rua de atropelar.

E nem de aeroporto ou edifício que um fanático pode explodir.

 

Poeta é quem pedir. É quem mendigar

uma palavra amiga que nunca virá.

A cura.

Pois

se Deus existir de que adiantará ter sido poeta.

E se Deus não existir, você não saberá

se poeta ou poetastro foi.

 

Portanto, vamos viver entre os astros.

E explodir em mil sóis.

Fazer de cada um uma noz.

 

E que lá dentro de cada planeta que somos nós

esteja o que somos e aquela célula de sonho e liberdade

que não pode inibir

a poesia de metamorfose ser.

 

Barricada quando guerra.

Barrigada quando jogo.

Tudo faz parte do mesmo do que digo

e se não prossigo

é por que a minha bunda está cansada

e minha perna formigando

e a barriga pede almoço.

 

Foi longa a invernada

e neva na cadeira de metal

e há notas no petisco em cima da cauda do piano de calda

e só quero saber quem eu sou nesta viagem

no guardanapo de papel

ao som do samba de um avião que jogue flores coloridas

sobre as dores reprimidas.

Um dia tudo volta e a guerra acaba e as perguntas continuam ou mudam?

Serão os chineses que produzem os paraguaios tênis bamba?

((Sim. Sou marginal de boutique!

E quero ter certeza de que morrerei

na bica de um avelós

e com uma sede rimbauldiana estranha a ofuscar-me a entranha.))

 

 

 

 

a gota suspensa pelo medo

 

A concha guarda em si segredos

E todo o mar do mundo

Cabe dentro dela

 

A garrafa jogada ao mar

Leva uma carta

 

A mensagem veio anexada

Com um vírus

Que não tinha cura

 

A concha A garrafa A mensagem

Estão para o mundo

Assim como os devaneios estão para os medos

Sempre contendo algum segredo alguma onda

Outra agonia

 

Por isso há que se ter cautela com a navegação parada

De uma vaga suspensa pelo fogo

No fogo dessa lareira que nunca se apaga

 

 

 

 

são rodrigo

 

Ainda alguma iguana

Anda desumana

Pela chuva de suas pegadas

 

Ainda alguém que sofre

Sofre no silêncio de uma escuridão de brasões em fuga na parede

 

Quem sabe um dia o que farão

a mim

quando eu surtar de novo

 

Me porão no porão

para comer estrelas com arroz doce com canela

e ver as estalactites pingando na minha cabeça

 

Eu que fui quem não quis

sei muito bem ser como quero

Acho que hospício

é meio um cemitério

 

 

 

 

ciranda cirandinha

 

A cidade tem cheiro de puteiro

O puteiro tem cheiro de banheiro

O banheiro tem cheiro de esgoto

O esgoto tem cheiro de morto

O morto tem cheiro de rato

O rato tem cheiro de mato

O mato tem cheiro de bosta

E mesmo assim todo mundo gosta

 

O pão tem cheiro de mofo

O mofo tem cheiro de patrão

O patrão tem cheiro de estado

O estado tem cheiro de ladrão

O ladrão tem cheiro de roubada

A roubada tem cheiro de privada

A privada tem cheiro de bosta

E mesmo assim todo mundo gosta

 

Todo mundo gosta da própria bosta

 

 

 

 

esquinas

 

há um céu que se divide

entre azul e cinza e nuvem

 

há carneirinhos em seus cabelos

e lésbicas rodando bolsinha

 

na manhã de minha sopa quente

há barbitúricos e cocaína

 

no clitóris da paisagem

há uma engrenagem nuance

 

entre azul e cinza e nuvem

há um céu que se divide

 

 

 

 

consentido

 

Os sentidos são seis. Tato. Olfato. Audição. Visão. Paladar.

A alucinação fica por conta de vocês.

 

Há os que preveem o futuro.

Há os que veem no escuro.

Há toda uma gama de realidade q faz parte da minha realidade e.

 

Para mim os sentidos são 16.

16 beijos perdidos.

16 acordes que aprendi.

16 vezes medo.

E algum que guardo como segredo.

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