fotos em imagem original de milo baumgartner

 

 

Como é bom ser modernista!

 

 

“A diversidade é positiva, mas no momento poético brasileiro os poetas se entredevoram de forma animalesca, são uns brucutus. E, ainda por cima, são comadres: há intrigas, intrigalhas, grupelhos, panelinhas. Diante disso tenho uma grande dose de amargura, melancolia, recolhimento. Me impus que não interessa sobrepujar ninguém, mas cada vez mais me sobrepujar, atingir pontos expressivos mais altos. Este é, definitivamente, o meu caminho".

 

Waly Salomão, Jornal O Globo

 

 

Quando dizem que o país não saiu do Barroco eu penso, não acato, mas sou pouco menos grave. O Brasil não saiu do Modernismo. Não venceu a barreira do ismo. Isso, culturalmente, graças à semana de 22, aos grandes Mário e Oswald. Poderíamos estar na cultura rupestre. E do ponto de vista dos meios de produção, há Brasis pré-históricos, mas isto é assunto para outro articulista cibernético, ligado em história. Fiquemos então com a questão cultural. O fato de o país — e o produtor cultural brasileiro — não ter entrado ainda na pós-modernidade, acelera o processo de “brucutulização”. Sem a dor de plagiário, o poeta poderá se exibir usando formas do presente e ferramentas do passado ou vice-versa. Mas em que o fato de ainda não ter entrado na pós-modernidade prejudica nossa cultura?

Para  Ariano Suassuna, poeta renomado e defensor da cultura popular, nada. Também no caso de Geraldo Carneiro, para quem só existem novos Rilkes, a situação é a mesma. Se falarmos do poeta Alexei Bueno: ele também está em outra. Assim ficaria citando uma grande quantidade de poetas que estão fazendo arte diferenciada, com enfoque ainda modernista. Vejam bem, a variedade é salutar, mas há um agravante na postura desses poetas. Todos usam do seu grande talento para dividir e não para somar. Como assim? Ao dizer "o certo é isso". Há a negação de uma gama enorme de outras formas de se fazer arte. Portanto, aqui no Brasil, se a moda é poema longo, todo mundo vai fazer poema longo, invalidando o poema Chanel — já que está tratando poesia como cabelo. Também há de se esclarecer as formas pelas quais os poetas se afirmam. Eles o fazem negando o passado ou ficando com uma ínfima porção das terras culturais descobertas. Afirmam, destruindo. Tudo que é o outro não tem valor. Aqui, cito Caetano:

 

“Narciso acha feio o que não é espelho”.

 

O produtor cultural não sabe conviver com outra forma artística que não seja a sua e de sua patota.

Onde ficam os novos poetas? São ioiôs. Escrevem o que é moda num dia e o que já foi no outro. E as revelações são como musas e duram um verão. O poeta do verão é Osório Pinauda.

Alguns concursos deveriam dizer qual é a sua banca examinadora. Quando a comissão for formada por Arnaldo Antunes, Décio Pignatari, Humberto de Campos, o resultado será um. Não importa a obra. Se o poeta for concretista, ele ganha. E se juntar Geraldo Carneiro, Cacaso, Antonio Cicero, esta plêiade vai escolher com menos barroquismo, mais popularmente. Com Alexei Bueno, Bruno Tolentino e Ivo Barroso é outra possibilidade. O que quero com esse papo do balacobaco não é uma união totalitária por um mundo melhor comunista, socialista, capitalista de centro, anarquista. Quero, simplificando, a coexistência de opostos, do caos. Admiro todos citados aqui, geniais. Por isso, reivindico pós-modernidade. Peço caos na quantidade e qualidade e ordenação no ato de conviver, respeitar.

Pode-se tudo, então? Ora quem faz a regra é o poeta. Se ele quiser seguir teoria, melhor ou pior. Só espero que não alimente a fogueira das vaidades. Porque nem sempre o que eu faço é a melhor coisa do mundo... E a que os deuses fazem... Ah, isso dá outro Balacobaco.

 

CONTROVÉRSIAS

 

Affonso Romano de Sant’Anna

 

Segundo Drummond

não se deve fazer poesia

sobre infância, corpo,

amor e acontecimento.

Mas para a complexidade

do problema

foi com esses e outros temas

que ele fez os seus poemas.

 

Segundo os vanguardistas,

o verso, o discurso, o poema

há muito feneceram.

Mas com isso se meteram

num insolúvel dilema,

porque o verso, o discurso, o poema

nos seus poemas

— permaneceram.

 

Segundo os simbolistas

a poesia ou é música

ou, então, prosa banal.

Com isso se inutiliza

a poesia do Cabral.

 

Segundo Cabral

lirismo não é poesia,

é lixo prolixo

E isso dizendo

de maneira espartana

jogou no lixo

a poesia do Quintana.

 

Segundo Quintana

poesia de participação

não é poesia,

e assim se condena

a poesia do Sant'Anna.

 

 

[Escrito para o e-zine Balacobaco, em abril/2002]

volta <<<