os agentes B

 

Rafael Nolli

 

 

Para Rodrigo de Souza Leão

 

1 – Top Secret

 

O poeta trazia um chip escondido no corpo.

Aos 23 soube que era rastreado —

 

numa sala escura um monitor Toshiba

piscava uma luz verde que era ele:

 

se súbito virasse à esquerda

e corresse até o tênis acabar eles saberiam.

 

Mergulhar por dias em piscina, de escafandro,

ou enfiar o dedo na tomada não adiantava —

 

era à prova d'água, imune ao curto-circuito.

 

A luz continuaria piscando, indicando

aos agentes que ele estava onde estava.

 

Com a faca arrancá-lo seria em vão.

Outro seria posto no lugar do primeiro —

 

à noite, pelo pai; ou num ato violento por eles.

 

Novamente internado, voltaria

com a tecnologia re-implantada —

 

up grade da versão dois ponto zero,

mais moderna, com sinal via satélite.

 

 

2 – Fuga e Outros Movimentos

 

Certo dia, perseguido por todos,

desceu correndo os treze andares da CEF,

contando cuidadosamente cada degrau.

(Diante do impasse, quase voltou para conferir)

 

Os macacos em seu encalço

— mordendo o calcanhar do tênis Nike —

seria uma prévia de tantas outras perseguições.

(análogas às exibidas na Sessão da Tarde)

 

Aquele era o momento de lamentar não ter fu-

gido com Rimbaud — companheiro de manicômio

onde trocavam figurinhas do time do Flamengo.

(Álbum Campeonato Brasileiro, 1989)

 

 

 

3 – Necrológio

 

Acordou vinte anos depois

— ressaqueado de Haldol —

seu nome inscrito no obituário.

 

Levantou da cama

— a hora havia chegado —

e comunicou a todos que iria morrer.

 

 

15 / julho / 2009

 

 

L. Rafael Nolli (Araxá-MG). Poeta, publicou Memórias à beira de um estopim, 2005. Escreve o blogue Stalingrado III.
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