no litoral do tempo

 

 

O CICLONE

1

o ciclone nasceu sopro

branco. o lago tremeu no

calafrio das margens.

venta. dentro de uma

concha (eu) debuxava,

entalhava o poema.

tatuagem rupestre. pontes

se abrindo, pernas, olhos,

boca e tudo mais que se

abre meio enquanto folha,

estrela, pórtico, ponte,

átrio, portal.

 

 

 

2

aqui o vento faz a curva e

volta cardume: vida, vinda

em linhas e puçás. silêncio

e terror: sêmen. tudo ciclo,

fogo-fátuo, rictus. doses de

aiperon. vitral. torpedos.

chamas. cavalos de crinas

brancas. mucamas.

caubóis. comboios. joios.

jóias e círculos. pulseiras e

fitas do senhor de bom

fim, em cada início e meio.

o ciclone ejaculou por

todos os lugares. no futuro,

veria que os filhos do

ciclone eram todos homens

castrados por ele.

prometeu acorrentado.

 

 

 

3

riscar no vento, esculpir na

mobilidade. preencher a

inexistência com o nada.

buraco negro. num átimo o

grito agônico. como se o

ciclone varresse a

primavera. vivia comendo

bisnagas de frio e bebendo

café-petróleo do futuro.

parece que tudo aconteceu

enquanto eu penteava o

cabelo. enquanto isso, o

mar cheio de surfistas e

poetas que se beijavam

conspirava contra a

violência espúria dos

hipócritas.

 

 

 

4

será que um dia o silêncio

será ouvido, e cravarei um

punhal no peito da morte?

então, poderei dizer das

pegadas do fantasma

chamado pai. ainda

existem folhas poluindo as

palavras com figuras de

linguagem. tudo poderia

ser etéreo. tenho feridas

ciclônicas, agora que

acabei de conter o ciclone

dentro de uma garrafa e o

mandei para um instituto

meteorológico. mandei

junto (em atach) uma outra

mensagem feita de nuvens

coloridas e algodão

amargo e pó-de-mico e

bicho-do-pé. que se cocem

em falésias alcantiladas.

 

 

 

5

vejo um ciclope cego e

alguns anjos correndo em

esteiras ergométricas. a

branca de neve anda de

mãos dadas com o

curupira. a emília dá um

chupão no mickey mouse.

fazem amor hércules e o

pintinho frajola. enquanto

isso, zé carioca beija o

capitão marvel. contam-me

histórias que não sei se

vivi. escarro para o alto

porque sou um chafariz,

chafurdo.

 

 

 

6

fogo amarelando o

horizonte. sombras são

mulheres de preto ou

garças de luto. a mendiga,

cheia de latas, figas e

espelhos que refletem

imagens. a tarde invade o

sol, o mar e a eternidade

(soldados de chumbo,

presentes da infância. as

bonecas eram apenas

mulheres do falcon.) ouvi

uivos dos castelos, areias

em minhas mãos.

 

 

 

 

7

tudo já feito, tudo por

fazer. toda minha família

estava no circo. os

palhaços comiam manga,

engoliam o caroço e

ficavam entalados, vôos de

acrobatas. (quando

acordei, com pterodáctilos,

nova visão do mundo.)

soltei-me, e minha família

tinha ido toda embora.

tudo já dito, tudo por dizer.

 

 

 

 

7a

ciclone clona clones e a

vela vela a velha e ovelhas

aquecem os lobos e o

cosmos come buracos e

haicai: amordaçaram/o

silêncio/ecoou.

 

 

 

8

ciclone, disco em alta

rotação. o vinil virou

cinzeiro, o ciclone é em

sensurround cospe mantras

em dobly estéreo.

 

 

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